domingo, 2 de novembro de 2008

Luta estudantil, qual o seu fim?

Para o dia 5 de Novembro foi convocada uma manifestação dos alunos do ensino secundário. Nas ruas vão tentar ganhar os seus direitos perdidos, lutar contra o novo estatuto do aluno e o regime de faltas. Vão fazer barulho, vão gritar e marchar, escoltados pela Policia de Segurança Pública, vão gritar palavras de ordem na tentativa de reaverem os seus direitos. Sabemos que as manifestações são um dos mais importantes veículos de luta social. Mas em que contexto é que estas devem ser feitas? Será que esta manifestação dos alunos irá alterar alguma coisa? Será que os estudantes irão marchar na real tentativa de mudar algo?

Em primeiro lugar não podemos analisar a manifestação num contexto de causa social sem olhar para os problemas vigentes no próprio sistema em que nos encontramos inseridos. Temos que alargar a nossa visão social. Com a implementação do Tratado de Bolonha ficou sentenciado que o ensino na Europa iria ser dividido, os países mais desenvolvidos tecnologicamente, no limite da fronteira tecnológica deveriam de apostar ao máximo nas suas faculdades, enquanto que os países de segundo nível na Europa deveriam de centrar os seus esforços na construção de um ensino secundário forte e de "qualidade". Assim assiste-se passivamente à mercantilização do ensino, à privatização da educação. O Novo Estatuto do Aluno, mais não é de que uma ramificação do Tratado de Bolonha. Pretende-se a privatização do ensino, de modo a que o estado reduza os seus gastos, o investimento será feito através de privados e estes irão fazer todos os possíveis para que obtenham o máximo de lucro à custa de um direito inalienável dos cidadãos.

Quando o Tratado de Bolonha e o Novo Estatuto do Aluno foram rectificados onde estava o activismo escolar? Simplesmente não estava, porque em Portugal não existe. As Associações de Estudantes, deveriam de ser os representantes dos alunos, das suas visões e a vanguarda que defenderia os seus direitos. Ora, tal situação não existe. Hoje em dia as Associações de Estudantes mais não são do que simples organizações de festas, muitas vezes subjugadas pela sede de dinheiro proveniente de tais eventos. Noutros casos, encontram-se subjugadas pelos Conselhos Executivos, que exercem o seu poder e à base das ameaças e assim vão reduzindo o poder das A.E.´s ao nulo.

Passado quase 3 meses da ratificação do Novo Estatuto do Aluno, as centrais partidárias, resolvem organizar manifestações a nível nacional para demonstrar como os estudantes estão activos. Contudo essa não é a realidade, os estudantes não estão minimamente activos. As juventudes partidárias são obsoletas do ponto de vista social, - tal como os seus partidos são. Governados através de uma hierarquia rígida, as juventudes representam a base, fazem o que é ditado pelos seus superiores. Os movimentos estudantis, que são desenvolvidos principalmente pela JCP, não possuem qualquer autonomia ou liberdade para a realização de acções. Marcham quando lhes mandam marchar, gritam quando lhes mandam gritar e calam-se quando lhes mandam calar. De nada serve a efectuação de tais manifestações ou entrega de flyers que pedem a solidariedade dos estudantes. O problema reside no facto que grande parte dos membros das juventudes nada saberem sobre o seu partido, sobre o suposto ideal que defendem e sobre a realidade vigente da situação. - Perguntem a membros de JCP´s, JS´s e afins o que é o Tratado de Bolonha e tirem as vossas conclusões -, vão ás manifestações porque lhes dizem para ir, só sabem que estão ali a lutar contra as politicas do governo, não sabem muito bem quais, mas estão lá.


Supostamente autónomas, estas juventudes, não deveriam de agir agora. Agem agora, porque foi assim que o partido lhes disse, - de forma a preencher de modo homogéneo o calendário politico do partido. Se fosse a mudança o que os partidos realmente querem, então deveria de se ter agido à três meses atrás, quando o novo estatuto foi aprovado. Á semelhança do que foi feito por essa Europa fora, deveria-se de ter agido no momento, para não dar espaço ao governo, ainda antes do estatuto ter sido aprovado. A diferença é que aí foram os jovens que de livre e espontânea vontade ocuparam escolas, manifestaram-se à frente de parlamentos, lutaram com os mesmos que dia 5 vos vão escoltar, e fizeram isso tudo a saber o que estavam a fazer. Estavam informados e eram autónomos, não tinham bases partidárias a controla-los.

E assim como são os membros das juventudes partidárias, suposta vanguarda estudantil, são os estudantes. 90% dos estudantes presentes nas manifestações, que não sabem porque lá estão, vivem cegos e na ignorância, vão a este tipo de eventos porque é fixe. Faltar ás aulas e nem participar na manifestação é heroíco, mas faltar ás aulas e ir a uma manifestação dos estudantes então isso é fantástico, mesmo que não saibam muito bem o que lá estão a fazer. E qual o resultado efectivo destas manifestações? Sejam elas de estudantes, professores e sindicatos capitalistas? Algum objectivo é alcançado? É através de uma manifestação que se consegue alcançar os direitos em luta? Qualquer pessoa consegue perceber que não. Este tipo de manifestações mais não é, do que jovens a divertirem-se, a viverem os anos loucos da adolescência no máximo. Nenhum deles luta pela realidade, porque simplesmente não a conhece. Alias, este género de demonstração é altamente embaraçoso para os estudantes e acaba por só os descredibilizar. Jovens aos gritos e pulos, a gritarem rimas politicas sem grande sentido, emissários de partidos a falarem à televisão sem saberem muito bem o que dizem. Não se apercebem, que os mass media, mais não procuram do que acabar por descredibilizar o movimento em si. É ridículo, é embaraçante e no fundo não resolve nada.

O que é necessário compreender é que as manifestações e tais tipos de demonstrações não podem ser vistos como fins, mas sim como meios para atingir um fim. As manifestações por si nada resolvem, nem nada mudam. Se as juventudes partidárias estivessem realmente do lado dos estudantes, então teriam que desenvolver um projecto continuo, em que a informação chegasse a todos. Para que os estudantes se apercebesse da realidade e começassem a desenvolver algum tipo de interesse por noções politicas. A luta não pode ser vivida uma vez ao ano, em espécie de tradição calendarizada pelos próprios partidos, a luta tem que ser vivida constantemente através de centrais horizontais, onde os estudantes desenvolvem projectos de entre-ajuda, onde possam ganhar autonomia e não ficarem presos a agendas politicas. Se dia 5 irá ocorrer uma manifestação, então durante o ano, acções como esta deveriam de ocorrer, deveria-se informar os estudantes sobre a realidade, a luta só estaria terminada quando os objectivos fossem atingidos, até lá a luta deveria de ser constante e sem interrupções. Ora a luta que hoje temos é espectáculo, nada mais é do que uma forma de cativar mais jovens a entrar nas fileiras dos partidos e comportarem-se como cordeiros sob o cajado do pastor que os controla.

É necessário que haja autonomia e para tal é necessário a existência de projectos que assentem em bases horizontais, desligadas de partidos e que hajam sem pedir permissão a ninguém, que lutem através da acção directa não-violenta e sobretudo através da informação disponibilizada a outros estudantes. Enquanto continuarmos presos a juventudes partidárias o Governo tem caminho livre para nos reduzir a meros números no sistema.

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